quarta-feira, 28 de abril de 2010

Na tarde do terror, César Brito foi Rei

Aproxima-se a passos largos o jogo da época, o Porto x Benfica. Já ouvimos esta frase feita para encontros com esse mesmo clube por duas vezes esta época e também já a ouvimos quando defrontámos o Sporting de Braga, mas o jogo da época é, pelo menos para mim, aquele que nos pode dar o título, ainda por cima na casa do rival. Deixemo-nos de hipocrisias e admitamos a verdade: sabe muito melhor vencer o título precisamente frente ao clube que tentou destruir o nosso nos últimos 30 anos, ainda por cima no estádio deles, não sabe?

Por isso, vamos recordar uma tarde de terror que acabou em beleza para as nossas cores, uma tarde na qual o Benfica não ganhou imediatamente ali o campeonato, mas ficou muito mais próximo de consegui-lo.

Foi no dia 28 de Abril de 1991 que se decidiu toda uma época. O Porto havia sido campeão no ano anterior, usava o escudo, mas recebia a melhor equipa portuguesa a altura, finalista vencida da Taça dos Campeões Europeus do ano anterior, liderada por um sueco que havia chegado alguns anos antes e que revolucionou o clube. O Benfica levava um ponto de avanço quando se deslocou às Antas, nessa tarde, talvez recordando a derrota duas semanas antes, no mesmo local, frente à mesma equipa, mas para a Taça de Portugal. O que se disse e o que ocorreu nesse jogo são os melhores exemplos daquilo que foi o futebol português nas décadas de 80 e 90: disse-se que o árbitro Carlos Valente, de Setúbal, tinha viajado com o Benfica, acusações falsas como se provou posteriormente; o autocarro do Benfica foi apedrejado; o balneário onde o Benfica se deveria equipar foi infestado por um produto com um cheiro de tal modo nauseabundo e tóxico para humanos que os nossos jogadores tiveram de se vestir, imaginem, no corredor de acesso ao campo, vulgo "túnel das Antas", local de coacção, espancamentos, um local à margem da lei, onde pontificava uma célebre figura que ficou conhecida, diria mesmo que atingiu o mediatismo, por Guarda Abel.

As equipas entraram em campo à maneira antiga: primeiro o Benfica, chefiado por Veloso, ouviu uma monumental assobiadela da assistência, com o habitual coro de insultos; depois o Porto, com mítico capitão João Pinto, autor de tão célebres frases como "o meu coração só tem uma cor: azul e branco!", a comandar o seu grupo, que foi fortemente saudado pelos adeptos. De um lado Artur Jorge, treinador do Porto, ele que fora avançado do Benfica e que poucos anos mais tarde voltaria à Luz, na condição de treinador, para destruir a mando de alguém uma fabulosa equipa; do outro lado o senhor Sven-Goran Eriksson, autêntico gentleman, o segundo homem a revolucionar o futebol do Benfica depois de Otto Glória, e que ainda conseguiu ganhar vários títulos num futebol onde a teia corrupta estava já bem instalada.

O Benfica apresentou um onze com Neno na baliza, um trio de centrais com William, Ricardo e com um jovem muito promissor à altura, de seu nome Paulo Madeira. Um meio-campo bem povoado com Thern e Paulo Sousa mais no centro, Veloso à esquerda e Paneira à direita, fechando sempre que preciso, e Valdo, próximo do ponta-de-lança Rui Águas, ajudado por Pacheco. No banco estava... César Brito.

O jogo não foi bonito, longe disso, houve as habituais picardias que foram, infelizmente, muito mais que simples picardias. Agressões bárbaras e um penalty escandaloso e obsceno sobre Pacheco, salvo erro, que o árbitro fez questão de ignorar. O Benfica jogou o que pôde e o que deixaram e com o decorrer da partida o resultado manteve-se, o que agradava de sobremaneira ao Benfica. Eriksson foi dando indicações para recuar no terreno e jogar no contra-golpe, algo que o Benfica soube fazer, desperdiçando inclusivamente boas ocasiões, algumas de vantagem numérica no meio-campo portista até. E eis que aos 81 minutos se dá a substituição que sentencia um campeonato: Svennis decide retirar Pacheco para colocar César Brito.

Nos dez minutos que se seguiram, o Benfica, especialmente graças a César Brito, fez a história do jogo. Cruzamento de Paneira, da direita, para cabeceamento de cima para baixo de César Brito, que fazia o 0-1. Poucos minutos depois outra vez César Brito, a passe de Valdo, na esquerda, marca golo à saída de Vítor Baía. 0-2 feito, o Benfica conseguia uma brilhante vitória nas Antas, a primeira em 14 anos a contar para o Campeonato.

2 comentários:

Manuel Oliveira disse...

JNF, tive o prazer de assistir a este jogo memorável!

Nuno disse...

Lembro-me de ouvir o relato deste jogo com uma clareza notavel. Ia em viagem com pais e avos, era puto, mas rebentei de gozo com a vitoria. Lembro-me de ver centenas e centenas de carros com cachecois e bandeiras na A1. Lembro-me dos buzinoes com que se saudarem os golos.
Lindo.
Faltam 55h para outra celebracao.