domingo, 2 de setembro de 2012

O meio-campo do Benfica e o queijo suíço

O Benfica venceu o Nacional por 3-0. Não sei que jogo viram, mas o que eu vi, ou do que pude ver, fiquei preocupado com vários aspectos do jogo do Benfica. Houve muita falta de vontade e algum amadorismo até. Erros antigos, vícios velhos e pouca evolução. E com a saída de Javi, novos problemas apareceram. Se isto foi assim hoje, não quero pensar no que pode vir a ser no futuro. Urge evoluir. O Benfica venceu o Nacional por um resultado totalmente enganador. Se houvesse competência do adversário, e vai haver no futuro, porque nem todas as equipas são tão medíocres como o Nacional, vai haver muita choradeira para os lados da Luz.

Tacticamente, a equipa é uma nódoa. Parece que não se prepara, que não estuda os adversários, que aplica o mesmo modelo de jogo e as mesmas ideias padrão para cada jogo independentemente do adversário, sem qualquer preocupação pelos pontos débeis dos rivais. Se as coisas saem bem, à primeira, maravilha. Se tal não acontece, está o caldo entornado. A equipa perde o norte, Jesus disparata e começa a tirar médios para meter pontas-de-lança, lançam-se todos ao ataque e fé no Artur lá atrás. Surreal. Isto não é de mestre da táctica. O Benfica, actualmente, vive de individualidades. Vive da inspiração de Salvio, que tem sido enorme neste arranque de época. Vive dos golos de Cardozo, da entrega de Witsel e de raides de Rodrigo. O Benfica é pouco mais que isto. Vêem uma equipa neste Benfica? Eu vejo apenas 11 jogadores, não uma equipa. E no futebol, como é sabido, o todo é mais que a soma das partes.

Há vários aspectos específicos do jogo que não consigo entender. Um deles é a saída para o ataque organizado. Nos primeiros anos de Jesus, quando Aimar era titular absoluto, o argentino baixava no terreno e, apoiado pelos colegas que se encontravam perto, lançava o Benfica no ataque. Hoje, sem Aimar, não há ninguém que desça para assumir a batuta e o espaço entre os jogadores de trás (Luisão, Witsel e Garay) e os da frente é colossal. Como pode o Benfica tentar sair a jogar de forma organizada com a equipa partida em dois bolos, com a bola nos jogadores mais atrasados, e com os jogadores mais adiantados longíssimo dos três de trás? Hoje voltei a assistir a algo que pensava já estar completamente ultrapassado desde os tempos de Camacho: Luisão, o maestro, o organizador de jogo quando Pablo Aimar (ou outro qualquer "fantasista") não está em campo. Voltámos aos piores tempos da época 2007/2008, onde o chuveirinho de Luisão foi o método mais usado para sair a jogar.

Outro dos enorme erros deste Benfica é o posicionamento de Witsel na saída com bola. Não pode estar constantemente a fazer o que Javi fazia se for a aposta de Jesus para "6" da equipa. Quando Witsel baixa no terreno para o meio dos centrais, o Benfica perde o seu melhor e mais importante elo de ligação entre defesa e ataque. Eu não estou à espera de ver Carlos Martins a pegar na bola e levá-la para a frente como o belga faz. O mal do Benfica é não ter dois "Witseis". Mas se eu pudesse escolher apenas um, escolheria o Witsel "número 8", não o "número 6". É aí que rende mais e onde pode dar mais e melhores soluções do ponto de vista ofensivo e defensivo, sobretudo no que aos equilíbrios diz respeito. Na ausência de Javi, Airton ou Amorim dariam tanto jeito. É que se faltar Matic, o Benfica ficará de braços e pernas atados, Jesus sabe-o e disse-o no flash interview da SportTV: "se tivermos de lançar jogadores como o André Almeida ou o André Gomes, vamos pagar a factura". Pois vamos, e não vai ser barata.

Mas, paradoxalmente, o Matic no qual Jesus confia é o mesmo no qual Jesus não confia. Confusos? Ouvir Jesus, um nabo táctico, dizer que Matic ainda não tem conhecimentos tácticos que lhe permitam fazer a posição de Javi, é de génio (disse-o antes do jogo). Portanto, recapitulando, Matic é jogador do Benfica desde Janeiro de 2011, treina com Jesus desde Junho de 2011 e, em 14 meses com Jesus, não aprendeu o suficiente para jogar a trinco. Já Melgarejo, em apenas um mês, aprendeu o suficiente para ser titular a defesa esquerdo. Das três, uma: ou Matic é burro, ou Melgarejo é um génio ou Jesus quer tomar-nos por parvos. Vou pela terceira.

Defensivamente, o Benfica é um caos. O número de vezes em que os adversários aparecem em superioridade numérica é preocupante. Foram várias as vezes em que o Nacional galgou 30, 40, 50, 60 metros no terreno, à vontade, em contra-ataque, sem oposição e muitas vezes em igualdade numérica ou até em superioridade. A quantidade absurda de vezes que chegaram à entrada da área prontos para rematar à baliza de Artur é inadmissível. A pressão exagerada com 3 homens a caírem sobre o portador da bola deixando crateras maiores que as da Lua para o Nacional atacar só resultou em lances de golo para os insulares. O espaço concedido nas laterais fruto das acções ofensivas do paraguaio e do uruguaio é mais que muito. Nunca, em toda a minha vida, vi o Benfica defender tão mal.

O Benfica está a viver das individualidades. Vive de fogachos ofensivos e da inspiração momentânea dos seus craques. E é assim que vai ganhar os jogos do campeonato, tal como o Porto. Com dois treinador tacticamente presos no Paleolítico inferior, Benfica ou Porto, apenas um deles, será campeão e tudo graças às individualidades. Elas vão resolver os jogos. Hoje foram Cardozo e, sobretudo, Salvio pelo Benfica. O Porto, quando se sentir apertado, vai recorrer a Hulk como se não houvesse amanhã. Quando o "gás" destes atletas esgotar... caput! Adeus título. Se é verdade que a liga portuguesa em termos de competitividade bateu no fundo, não é menos verdade que os treinadores para 2012/2013 são dos piores que tenho visto em largos, larguíssimos anos.

Eu já vi este filme, conheço de cor o guião e as personagens e até acho que já sei o fim.

10 comentários:

Coach disse...

Este é o melhor post que vi na blogoesfera benfiquista nos ultimos tempos.
Se não te importares vou copiar para o meu pequeno tasco.

Anónimo disse...

Completamente de acordo com esta análise...
Não sou mentiroso, admito que passei uma grande parte do jogo (a partir dos 25 minutos) a desejar que o Nacional marcasse um golo.
Podem chamar-me os nomes que quiserem, mas as coisas são assim mesmo...não falo nem mais um minuto de jogadores e treinadores, o mal do Benfica está todo num sr., que assaltou os estatutos para minimizar a concorrência, e alterou a data das eleições para que estas se disputem sempre numa época de "ilusão", sem um efectivo balanço desportivo de uma época.

Ora (infelizmente) num clube de futebol os sócios não tem o distanciamento critíco necessário para avaliar a gestão desportiva de 4 anos, se a equipe estiver no topo da tabela.

Sei bem que esta equipe (como está) nunca será campeã...e a melhor coisa que nos podia acontecer, era levar-mos um banho de realidade antes de Outubro. Mas nem isto está fácil, graças ao sorteio condicionado, paragem das selecções...enfim!

Estou resignado a mais 4 anos disto. O Benfica em 2016, terá um passivo colossal, ganhará duas taças da liga até lá, o plantel terá mais de 80 jogadores...e pronto! assim nos fizémos...

aalto

NSC disse...

No jogo de ontem o segundo golo é fruto de individualidades, mas:

1º golo: Enzo abre na esquerda, Rodrigo encosta na linha defensiva, Cardozo sai para fazer o apoio frontal e Melgarejo entra para o meio passando a bola a Sálvio. Este contemporiza e mete no espaço aberto para o Maxi, que contorna o guarda-redes e cruza para o Cardozo (que pela movimentação anterior tem mais espaço) fazer o golo.

3º golo: décalage ao 1º e 2º toques após lançamento de linha lateral: Maxi - Witzel (com bloqueio legal) - Aimar - Cardozo e pum!

Isto são fogachos individuais?

Ped Zimmerman disse...

JNF, The Footbal Whisperer.

Nem mais, nem menos. Está tudo aí. E a forma "calm assertive" como trataste o jogo e o Jesus neste post é de valor.

Alguém precisa de mostrar ao Jesus "boundaries and limitations", ele anda a fazer xixi nos cantos da casa e a rosnar aos donos. Trataram-no como uma pessoa inteligente e ele ficou confuso.

E o tempo extra de ontem? Até o Rui Santos ficou constrangido com a insistência da SIC nos 90 milhões e com a encenação daquela entrevista ao LFV no final do jogo. Tão bom! Areia para os olhos!

Anónimo disse...

Sou portista mas concordo com a parte final do post. O benfica, tal como o porto, vivem totalmente de individualidades com treinadores muito básicos. Não podia tê-lo dito melhor!
Relativamente ao benfica não tenho porque me intrometer mas esta política de só estrangeiros até me faz perguntar se não deveríamos desde logo poupar com a formação extinguindo as classes juvenis uma vez que é tudo para dispensar. É ridículo!!!!!Não vejo com bons olhos a selecção daqui a uns anos.

JNF disse...

NSC,

o 1º e o 3º golo não, são fruto de boas jogadas que são resolvidas pelo serial killer, mas o jogo do Benfica, globalmente, é.

Ped,

JJ precisa de trela, açaime e de voltar à ração antiga. Eu já perdi as esperanças em que este nabo aprenda algo. E já que estás numa de falar em inglês, aplicando a situação de JJ, "you can't teach an old dog new tricks".

Ped Zimmerman disse...

O mais curiosos é eu saber escrever whisperer e nao conseguir acertar em Football! ahaha

Bem verdade JNF, bem verdade, o senhor está enleado na sua própria arrogância, já não há volta a dar.

Um abraço

Anónimo disse...

Embora eu não concorde com um ou outro ponto específico deste post, que não vou agora especificar, até por falta de tempo, devo dizer que está muito bem feito, em vários aspectos. Por isso, tiro o chapéu a este texto.
O problema do meio campo do Benfica não é apenas deste ano, mas com a saída do Javi Garcia esse problema acentuou-se. Witsel consegue jogar a defesa direito, a trinco ou, como se costuma agora dizer, na chamada posição 8. Mas só nesta última é que, na minha opinião, ele consegue brilhar. E como ele não pode jogar a trinco, como aconteceu ontem durante a primeira parte do jogo, e, simultaneamente, na posição 8, o futebol do Benfica parece “cortado ao meio”. E isto nada tem a ver com Carlos Martins, que é um jogador de que eu gosto. Considero que Carlos Martins joga melhor tendo dois jogadores nas suas costas (e não apenas com um) que garantam segurança no meio campo quando ele faz incursões no ataque.
Agora vejamos, como é que o Benfica vai conseguir aguentar uma época inteira apenas com dois jogadores para as posições 6 e 8, ou seja, Matic e Witsel? Como?!Já tínhamos dificuldades quando possuíamos 3 jogadores para fazer face às 4 competições onde o clube participa, sem contar com as chamadas dos jogadores às selecções. E, mais, Javi ainda podia fazer uma perninha a central.
A solução para essa falta de jogadores parece ser a equipa B. Mas tem havido jogadores da equipa B a participar nos treinos da equipa principal? Ou, quando for necessário, basta ir buscar um ou outro jogador e pô-lo a jogar sem qualquer entrosamento com os colegas de equipa?

MM

J.P. Gonçalves disse...

Ainda bem que houve alguém a ver o mesmo jogo que eu.
Há por aí quem se embebede com os 10 golos marcados em 10 jogos e não veja mais nada...

Olho Gordo disse...

Eu vi o jogo todo. Os primeiros 45 minutos foram sofríveis e levaram-me a temer o pior. Fico sem saber se a entrada de Matic se efectuaria, mesmo que Carlos Martins não se tivesse lesionado.

Julgo terem sido dois os motivos que levaram o Nacional a quebrar:

1. Por aquilo que correram na primeira parte, muitos dos jogadores do Nacional ficaram extremamente debilitados para a segunda parte.
2. Os lances de golo nascem invariavelmente de um momento de inspiração ou rasgo de puro brilhantismo de um jogador do Benfica, não do colectivo.

A entrada de Matic só mostra aquilo que Jesus já devia ter aprendido há muito tempo. "Cada macaco no seu galho". Testes, adaptações e ideias luminosas testam-se nos treinos, não nos jogos oficiais.

Aquilo que JJ está a fazer com o Melgarejo pode correr muito bem ou muito mal. Valerá a pena o risco? Não sei. Mas acho que aquele corte de calcanhar, por mais espectacular que tenha sido, foi de uma inconsciência e de uma infantilidade de um jogador que se quer prático a resolver situações de perigo. Não sei se ele sabia que estava um jogador nas suas costas. A mim não me pareceu. Mas a possibilidade de um ressalto ir parar dentro das redes é grande de mais para se admitir uma coisa daquelas.

Concordo plenamente com a ideia de que ganhamos única e exclusivamente por termos melhores jogadores... e não melhor equipa. Mas espero melhor... muito melhor.

Já agora, onde está o Airton? Podemos chamá-lo de volta em Janeiro 2013, caso seja necessário?