Ao longo das últimas semanas assistiu-se ao famoso folhetim das 72 horas. O Porto cometeu uma ilegalidade, ainda que inadvertidamente (algo surpreendente no reino do Dragão), ao utilizar Sebá, Abdoulaye e Fabiano num período inferior a 72 horas em jogos da equipa B e da equipa A, para a 2ª Liga e Taça da Liga, respectivamente. O Porto cometeu uma ilegalidade, a notícia foi divulgada e houve duas atitudes de duas facções diferentes que se mesclam no lamaçal que é o futebol português: a do Porto, que tentou justificar o injustificável com a utilização dos jogadores, atirando ainda poeira para os olhos das pessoas ao inventar notícias falsas acerca de uma suposta utilização irregular de jogadores por parte do Benfica, e a atitude da Federação, organismo que não é responsável pela organização da Taça da Liga, e cuja função neste caso específico era apenas e só desculpabilizar a infracção cometida pelos azuis-e-brancos. Como? Havia de se arranjar forma, só era preciso ser um pouco criativo.
E o passe de mágica foi dado esta quarta-feira. A desculpa esfarrapada passou pela não-aplicação do regulamento à Taça da Liga. O objectivo foi conseguido. O Porto pode assim participar na Taça da Liga. Bem-vindos a Portugal, onde o cumprimento das leis é motivo para punição e a sua violação é motivo para condecoração. Brilhante ainda o timing da tomada de decisão. Enquanto que no caso de Emídio Rafael, o Braga B foi imediatamente penalizado num curto espaço de dias, o caso do Porto foi-se arrastando e arrastando até aos limites. E qual foi o limite? A expulsão de Cardozo. Para calar os benfiquistas descontentes com esta decisão, Tacuara acaba de levar... 1 jogo apenas. "Para vos calar, lampiões", terão pensado os membros da Federação. Federação essa que, importa não esquecer, apoiamos. E apoiamos como? Inequivocamente, pois claro...
Acho ridícula a forma como o Benfica participou neste processo. Não sendo algo que não nos dizia respeito, era algo em que tínhamos de meter o nariz, obrigatoriamente. Sabemos como a justiça funciona e como não funciona em Portugal. Sem pressões, não se consegue nada. E o Benfica manteve-se inexplicavelmente passivo durante todo este processo. Porquê? O que ganhámos com isso? O que era suposto conseguir? Por que motivo é que o Benfica, desde o primeiro dia deste caso, não se pronunciou nem disse uma única palavra sobre o assunto? Porque não agitar as águas e amplificar a irregularidade cometida pelo Porto de modo a pressionar a justiça? Porque não deixar a ideia da verdade, de que o Porto era efectivamente culpado e só tinha de ser punido com a exclusão da prova? Não, o Benfica não fez nada disso, preferiu manter-se passivo, observador, expectante, à espera que acontecesse a absolvição anunciada. Pior. Sim, há algo ainda pior. A atitude do Benfica face ao levantar das suspeitas sobre a utilização irregular de jogadores da nossa parte. A denúncia anónima feita à FPF não tinha qualquer fundamento. A história das 72 horas não se aplica, obviamente, à mesma equipa. Se há dois jogos nesse espaço de tempo, o treinador não tem de mudar os 11 jogadores de um encontro para o outro. Era apenas e só isto, reforçando a ideia de que o Porto é que tinha cometido a ilegalidade e fundamentando devidamente, que o Benfica deveria ter feito. Mas não, reagimos da forma mais patética possível. Colocámos ênfase no facto de a denúncia ser anónima e emitimos um comunicado "à Porto". Por momentos fiquei na dúvida se aquele comunicado tinha sido escrito pelo Labaredas ou algo parecido. Aquela é a linguagem do Porto. Aquele é o modus operandi deles. E caímos nessa tentação. Deixámos a sensação de "lá vai o Benfica safar-se porque a denúncia era anónima, porque se não fosse, também eles iam de vela na Taça da Liga. São iguais ou piores que o Porto". Porque deixámos que isto acontecesse? E já viram a ironia? Nesse comunicado do Benfica, em vez de se dizer que a denúncia não tinha fundamento, e explicando porquê, preferiu-se colocar o foco na ilegalidade dos meios pelos quais a denúncia foi feita. Foi ao estilo de "estas escutas são ilegais, independentemente do conteúdo que contêm". Parabéns, pá, fomos Porto, reagimos à Porto. Vieira e demais lacaios, lembrem-se de uma coisa: à mulher de César não basta ser, é preciso parecer. E neste momento duvido que vocês "sejam", porque a única coisa com que se parecem é com um bando de falhados que não ganha um processo e que não coloca o Benfica à frente das prioridades pessoais. Defendam os interesses do Benfica, bando de cornos mansos.
Esté é o Benfica que eu aprendi a conhecer. Um Benfica que não antecipa o perigo, que não vê além do óbvio (e às vezes nem o óbvio vê) e que toma uma atitude de fanfarrão quando vai à frente. Despreocupado com o que se passa à sua volta quando segue na liderança, o Benfica que eu conheço acha que não é preciso reagir a nada. É um Benfica que dá entrevistas, que vai à televisão e que se pavoneia nos jornais. Invariavelmente, este Benfica acaba derrotado. Com surpresa para alguns, sem segredos para outros. O fim da história já todos conhecemos: acaba tudo num pranto, apontando desculpas para aqui, atirando culpas para acolá, rejeitando o demérito e recusando a crítica e a auto-análise. Este é o Benfica que eu conheço. Este não é o Benfica que eu quero.